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Quem semeia soja e milho transgênico colhe pobreza, artigo de Norbert Suchanek

[EcoDebate] “O Brasil está quebrado”, disse o nosso presidente Jair Bolsonaro no início de janeiro de 2021. E ele está certo. Mas a Covid-19 não tem culpa. A epidemia do novo coronavírus é apenas a gota que deixa o barril transbordar. A verdadeira causa é caseira. Há mais de trinta anos, os governos do Brasil esvaziam os cofres públicos com uma política de monocultura e geram mais pobreza e desigualdade em nome do “desenvolvimento”.

Durante décadas, o Brasil financiou a construção de infraestrutura como estradas, portos de exportação e barragens no Norte e Nordeste, com bilhões de reais do cofre público e empréstimos internacionais caros. Nos últimos anos, o foco dos investimentos foi MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), a nova frente do agronegócio.

Isso torna as lavouras de monoculturas lucrativas, especialmente a soja. Por isso, cada vez mais produtores de soja, em sua maioria originários dos estados do sul, e empresas do agronegócio estão ocupando cada vez mais áreas. Ao mesmo tempo, os agricultores familiares, as comunidades tradicionais, como quilombolas e geraizeiros e a biodiversidade perdem cada vez mais espaço.

A área plantada de soja no Brasil aumentou quase trinta vezes, de 1,3 milhão de hectares, em 1970, para cerca de 38 milhões de hectares hoje. Em troca, os milhares de hectares de campos mecanizados de soja e do milho transgênico criaram quase nenhum emprego para a população local.

“Soja levou subdesenvolvimento ao Cerrado”, escreveu o jornal alemão Deutsche Welle, em dezembro passado, referindo-se a um novo estudo da Universidade Católica de Louvain, da Universidade Chalmers de Tecnologia em Gotemburgo e da Universidade de Amsterdã. A Região do MATOPIBA é hoje a maior frente do desmatamento no país. A tragédia: rios poluídos, seca e comunidades extrativistas que perderam a subsistência. Mas as monoculturas altamente mecanizadas quase não geram empregos. Os pesquisadores verificaram cursos d’água secos ou com trajetória alterada, populações que antes tinham como viver do extrativismo e agora precisam comprar o mínimo para sobreviver, além de rios poluídos por agrotóxicos.

“A transformação social que a soja tem gerado no Matopiba não é inclusiva, é altamente excludente, e não caracteriza desenvolvimento”, afirma o cientista Mairon Bastos Lima, da Universidade Técnica Chalmers. “Não é desenvolvimento, é apropriação de recursos naturais de comunidades da região para um setor altamente concentrado do agronegócio.“ As pessoas da região têm perdido o acesso à terra, à água, sofrido violências e sido sumariamente desapropriadas do espaço rural, indo inchar as periferias das cidades, para benefício do monocultivo de soja.

Milhões de pessoas foram e estão sendo levadas à pobreza e à emigração pela expansão da soja. Para compensar, o governo usa bilhões de dinheiro público para alimentar os pobres com “Cesta Básica” e “Bolsa Família”, que reduz a pobreza pelo menos em suas estatísticas.

Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social, o número de famílias que recebem Bolsa Família mais do que triplicou no Brasil, passando de 4,5 milhões, em 2004, para cerca de 14 milhões em 2019.

O Brasil arrecada o dinheiro principalmente por meio de impostos sobre bens de consumo e alimentos: cerca de 17% sobre o feijão, 29% sobre a carne, 34% sobre o peixe, 34% também para manteiga, 36% sobre a margarina, 32% sobre a água mineral, cerca de 43% sobre a cerveja e na média 40% de imposto é cobrado para material escolar, como lápis e borracha. Isso coloca a maioria da população brasileira com renda mais baixa em desvantagem, e beneficia, por outro lado, os que já são ricos: a maioria paga a conta de poucos.

A expansão das monoculturas de soja, por sua vez, não produz mais alimentos, ela é responsável por menos diversidades de alimentos. Ninguém vive só de soja: as pessoas precisam de uma alimentação diversificada, como feijão, arroz, frutas, tomate, mandioca, vegetais e carne. Mas os pequenos agricultores e as comunidades que vivem da subsistência, que produziram de forma sustentável para si, precisam agora comprar a comida no supermercado: Menor oferta e, ao mesmo tempo, maior demanda de alimentos cada vez mais monopolizados. Tudo isso leva a um aumento dos preços dos alimentos para a população e, portanto, também aumento dos gastos do governo na redução da pobreza.

Em 2010, a Cesta Básica no Estado do Rio de Janeiro custava 213 reais. Em setembro de 2020, já custava 564 reais, um aumento de mais de 100 por cento.

As enormes monoculturas, por sua vez, causam erosão do solo, o que prejudica a qualidade da água dos rios e lagos. Soma-se a isso a crescente contaminação das águas a toxinas agrícolas, herbicidas e fungicidas, que reduzem a população de peixes e os recursos de água potável gratuita e limpa. Menos peixes nos rios e lagos também significam o aumento geral dos preços dos peixes. Rios contaminados levam ao aumento do consumo de água mineral engarrafada pelas multinacionais: Coca-Cola e Nestlé agradecem.

De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Água Mineral (Abinam), o consumo de água mineral no Brasil vem crescendo em média dez por cento há anos – com preços crescentes e aumento dos monopólios das multinacionais como Coca-Cola e Nestlé.

Todo médico sabe que a saúde está ligada a uma boa alimentação diversificada. Os pesticidas do agronegócio também levam ao envenenamento progressivo da população afetada, o que leva a alergias, asma, danos imunológicos e doenças como o câncer, o que por sua vez aumenta os custos para o sistema público de saúde, que é financiado com dinheiro dos contribuintes.

O Brasil é campeão mundial no consumo de agrotóxicos desde 2010. Um estudo publicado no ano passado, pela Misereor (agência episcopal alemã para a cooperação internacional para o desenvolvimento) e a Fundação Rosa Luxemburgo, relatou mais de 7.000 casos de intoxicação por pesticidas no Brasil, em 2017 – considerando que apenas os casos mais visíveis são registrados. O envenenamento sutil e diário permanece no escuro, sem registro.

O agronegócio e os grandes latifundiários que exportam seus produtos, como soja e carne, para o mercado mundial, ganham infinitamente nesse sistema de transferência da riqueza do povo.

Eles enchem seus cofres com dólares, enquanto pagam seus poucos funcionários no Brasil em real. E quanto mais os donos do agronegócio lucram, mais aumentam seus investimentos na expansão da lavoura e do monopólio progressivo de toda a produção de alimentos.

Para o consumidor brasileiro, isso significa cada vez menos variedade de comida na mesa, com preços cada vez mais altos, o que por sua vez, aumenta a pobreza e reduz a saúde da população em geral – razão pela qual o Governo está gastando mais dinheiro na redução da pobreza, através da “Cesta Básica”, do “Bolsa Família” e na saúde pública. O resultado são os aumentos de impostos sobre alimentos e bens de consumo, que por sua vez aumentam os preços.

Do ponto de vista da economia nacional, a política de expansão das monoculturas e da monopolização da produção dos alimentos que vimos há várias décadas sob os diversos governos de esquerda, direita ou conservadores no Brasil, é uma política suicida da qual poucos se beneficiam, mas não a população.

Agro não é “pop”. O agronegócio é uma das causas pelas quais o maior estado da América Latina quebrou ou está perto de ser quebrado.

Norbert Suchanek, Rio de Janeiro
Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia

Ecodebate: https://www.ecodebate.com.br/2021/01/19/quem-semeia-soja-e-milho-transgenico-colhe-pobreza/


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