Países pressionaram por mudança de último minuto que trocou ‘eliminação’ por ‘redução’ do uso do carvão; premiê britânico diz que acordo é ‘divisor de águas’ e ‘sentença de morte’ para combustível fóssil, mas com um ‘tom de decepção’.
Por BBC, via G1 Natureza
O desfecho da conferência climática COP26, que se encerrou no sábado (13/11) em Glasgow (Reino Unido) com um acordo assinado por quase 200 países, colocou a Índia e a China sob os holofotes.
O motivo é que, na reta final das negociações sobre o acordo, os dois países asiáticos pressionaram por uma mudança-chave no texto, no trecho que falava em abandono gradual do uso de carvão e subsídios a combustíveis fósseis. Em vez de se comprometer a acelerar a “eliminação”, a versão final do acordo fala em acelerar a “diminuição” dessas fontes altamente poluentes de energia.
Isso fez com que ambientalistas e analistas vissem um enfraquecimento no acordo final da COP, potencialmente dificultando o controle de emissões de gases do efeito estufa e a mitigação das mudanças climáticas.
O presidente da COP26, Alok Sharma, chegou a dizer que Índia e China teriam de prestar contas para os países mais sujeitos ao aquecimento global (caso de pequenas ilhas cujo território está diminuindo em meio ao aumento do nível dos mares).
“Vou conclamar todos (os países) a fazerem mais. Mas, com relação a o que aconteceu ontem (sábado), China e Índia terão de se explicar e explicar o que fizeram aos países mais vulneráveis ao clima”, disse Sharma ao programa da BBC Andrew Marr Show, acrescentando, porém, que “não descreveria o que fizemos ontem como um fracasso – foi uma conquista histórica”.
Em coletiva ao lado do premiê britânico Boris Johnson, neste domingo, Sharma adotou um tom mais contemporizador, dizendo que “diminui-se (o uso de carvão) antes de eliminar-se” e reiterando que é a primeira vez na história que um acordo climático menciona ambições relacionadas à redução do carvão.
Na mesma entrevista, Boris Johnson afirmou que a conferência trouxe um acordo “divisor de águas” que será a “sentença de morte para a energia a carvão”. Mas, apesar das conquistas da conferência, ela tem um “tom de decepção”, agregou o premiê.
“Aqueles para quem as mudanças climáticas já são uma questão de vida ou morte, que só podem assistir enquanto suas ilhas se submergem, suas terras agrícolas se convertem em deserto, que têm suas casas destruídas por tempestades, essas pessoas exigiam um alto nível de ambição da conferência”, declarou.
“Enquanto muitos de nós estávamos dispostos a isso, o mesmo não valeu para todos”, acrescentou o premiê, sem mencionar explicitamente Índia e China. “Infelizmente essa é natureza da diplomacia. Podemos fazer lobby, persuadir, encorajar, mas não podemos forçar nações soberanas a fazerem o que não querem. No fim das contas é decisão delas, e devem bancá-las.”
Ao mesmo tempo, Johnson disse que a difícil meta de manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C (acordada na conferência climática anterior, em Paris-2015) “ainda está viva”.
O carvão, grande emissor de gases do efeito estufa, ainda é uma fonte energética substancial em países como Índia e China – este último queima mais carvão do que todo o resto do mundo junto.
O correspondente da BBC na China, Stephen McDonell, confirma que a aliança sino-indiana para a mudança de última hora no texto tem sido vista como um esvaziamento para aqueles que esperavam um resultado mais ambicioso em Glasgow.
Mas ele ressalta que, internamente, o governo chinês já sabe que terá de reduzir sua dependência do carvão como fonte de energia – a questão crucial para Pequim é a velocidade com que isso vai ser feito.
O argumento de Pequim, diz McDonell, é que países desenvolvidos são responsáveis pela maior parcela do aquecimento que hoje recai sobre o mundo inteiro, e se tornaram ricos nesse processo. Portanto, prossegue esse argumento, os países desenvolvidos deveriam ser mais tolerantes com países como a China.
Embora tenha havido decepção por parte de ambientalistas, muitos ressaltam o caráter histórico da conferência encerrada neste sábado.
“Esta é a primeira vez que uma decisão na Convenção do Clima reconhece explicitamente a necessidade de transição de combustíveis fósseis para renováveis. Já tínhamos visto propostas nesse sentido em rascunhos de decisões anteriores, como do próprio Acordo de Paris, mas elas não sobreviveram em texto final”, disse à BBC News Brasil Natalie Unsterstell, especialista em política climática e integrante do Grupe de Financiamento Climático para América Latina e Caribe.
“É um reflexo direto de que os combustíveis fósseis estão perdendo sua licença social, isto é, sua licença para existir.”
A diretora-executiva internacional da ONG ambientalista Greenpeace, Jennifer Morgan, disse que o acordo “é tímido, é fraco, e a meta de 1,5°C está no limite da sobrevivência, mas foi emitido o sinal de que a era do carvão está chegando ao fim. E isso importa”.
Acrescentou que “se você é um executivo de uma empresa de carvão, esta COP teve um desfecho ruim para você”.
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