O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) divulgou nesta quarta-feira (28) o“Relatório Especial sobre Gerenciamento de Riscos de Eventos Extremos e Desastres para o Avanço da Adaptação Climática (SREX)”, que retrata o quão perigosas as mudanças climáticas já se tornaram.
O documento representa uma importante transformação na postura do IPCC, deixando de se focar na mitigação do aquecimento global para centrar seus esforços em mostrar que é hora de nos prepararmos para os eventos extremos que já são inevitáveis.
“Estamos pedindo que os governos se concentrem agora na redução dos riscos de desastres que já vêm acontecendo e tendem a piorar no decorrer das próximas décadas”, afirmou Chris Field, um dos editores do relatório e cientista climático da Universidade de Stanford.
“A mitigação ainda é importante, mas a perda de vidas e os prejuízos econômicos já estão acontecendo e vão piorar. Em um mundo mais quente, a frequência de tempestades, enchentes, secas e ondas de calor será maior”, acrescentou.
O relatório possui quase 600 páginas e oferece detalhes sobre desastres climáticos no passado e as tendências futuras para todo o globo. Além disso, apresenta a discussão de medidas de gerenciamento de riscos e ações já realizadas que podem servir de exemplo.
“Centenas de cientistas de todo o mundo trabalharam mais de dois anos no SREX. Neste documento estão presentes evidências, documentações e avaliações que o tornam uma peça importante para o direcionamento de decisões políticas”, disse Field.
Desastres
Segundo dados do Escritório das Nações Unidas para a Redução de Riscos de Desastres (UNISDR), 2011 foi marcado por 302 desastres naturais, que mataram 29.782 pessoas, principalmente na Ásia. O Brasil não está fora das estatísticas registrando 900 mortes causadas pelos impactos das inundações e dos deslizamentos de terras provocados pela chuva. A estimativa é que os desastres tenham gerado US$ 366 bilhões em prejuízos.
Uma das tragédias destacadas pelo SREX é a enchente de 2005 em Mumbai, na Índia. Uma tempestade que durou menos de 24 horas matou mais de mil pessoas e desabrigou outras 2,7 milhões.
Segundo o IPCC, Mumbai está na lista das cidades que podem se tornar inabitáveis devido às enchentes, tempestades e ao aumento do nível do mar. Outros munícipios em risco são Miami, Xangai, Bangcoc e Guangzhou.
“Muitos lugares já estão em uma situação mais grave, mas o risco climático está por todos os lados”, destacou Field.
Em um exemplo de como ações de adaptação podem fazer a diferença, o relatório cita dois ciclones tropicais, um, mais fraco, que atingiu Myanmar em 2008 e matou 138 mil pessoas e outro, que apesar de varrer Bangladesh em 2007, provocou a morte de apenas 3400 pessoas. Mesmo os dois países sendo extremamente pobres, as consequências das passagens dos ciclones foram bem diferentes.
De acordo com o IPCC, Bangladesh vem trabalhando desde 1970 com grupos internacionais para se prevenir contra as tempestades. O país possui sistemas de alerta, construiu barragens, abrigos e adotou medidas de conservação dos mangues, que ajudam a proteger as cidades da invasão das águas.
Já Myanmar, por possuir um regime político mais fechado e que impede intercâmbio de informações, não tem nenhum tipo de ação de adaptação. Assim, o número de mortos no país foi muito mais elevado.
O relatório reafirma a necessidade de cooperação internacional diante deste que é um dos grandes desafios do século XXI, lidar com as transformações do clima.
“Quando olhamos para o futuro, as mais difíceis decisões que tomaremos serão as migrações em larga escala e a mobilização de comunidades inteiras. Muitas pessoas terão que abandonar os locais onde sempre viveram e com os quais possuem laços culturais e históricos”, disse Field.
O cenário mais pessimista previsto pelo cientista já virou uma realidade. No começo deste mês, o presidente da nação insular de Kiribati, Anote Tong, anunciou que está negociando a compra de 20 km² de terras em Fiji, para poder realocar a população de 113 mil kiribatianos.
“Esta é a nossa última opção, não existe plano B. Nosso povo terá que se mudar, pois as marés estão alcançando nossas casas e vilas”, afirmou Tong.
O IPCC destaca que há evidências de que essas transformações extremas no clima e no nível dos oceanos são resultado das atividades humanas, incluindo a emissão de gases do efeito estufa.
A entidade concluiu que é provável que a influência antropogênica seja responsável pelo aumento das temperaturas médias, pelo aumento do nível do mar e que é de confiança mediana que contribuiu para a intensificação de precipitações extremas em escala global. Porém, ainda não existem dados suficientes para responsabilizar a humanidade por certos desastres, como a maior frequência de ciclones tropicais por exemplo.
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