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Copos: descartáveis x duráveis

Afonso Capelas Jr.

Dias atrás, tomando um café em uma padaria de São Paulo – cidade que vive uma crise de água sem precedentes, como se sabe – me deparei com um pequeno cartazcolocado no balcão, estrategicamente à vista dos clientes (veja a foto abaixo). Ele quer convencer o consumidor de que copos descartáveis ajudam a economizar a água da lavagem de copos duráveis.

Sempre achei o contrário. O processo de fabricação de um descartável utiliza bastante água. Sua reciclagem (isto quando ele é reciclado) também. Fiquei em dúvida quanto à veracidade dessas informações.

Fui, então, consultar o especialista em tecnologia de materiais, professor Bruno Gianelli, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), Campus Itapetininga.

FOTOCOPO

Imagem – Ed Grandisoli

O professor Bruno prontamente me atendeu enviando os seguintes esclarecimentos via e-mail. Tire você também as suas próprias conclusões, leitor:

“Inicialmente gostaria de dizer o quanto me chateia ver algo como esse cartaz fixado nos estabelecimentos de São Paulo, pois para medirmos o impacto ambiental de um produto é necessário levar em conta vários fatores. Por exemplo, o impacto decorrente do processo de fabricação do produto, o transporte do produto final até o local de consumo, a vida útil desse produto, entre outros.

Imagine que para cada copo descartável consumido foi necessário realizar um transporte do mesmo desde a fábrica até a padaria, bar ou restaurante no qual o mesmo foi utilizado, impactando em consumo de combustíveis fósseis e gases tóxicos liberados na atmosfera.

Para se fabricar um copo descartável é necessário o consumo de matéria prima, aproximadamente 8 gramas de poliestireno (PS) ou polipropileno (PP) –  os plásticos mais empregados pela indústria – e também o consumo de energia elétrica, cerca de 6,0 Wh por copo.

Outro ponto a ser considerado deveria ser o transporte, normalmente realizado em caminhões de pequeno porte até os atacadistas, com uma distância média de 150 km. Desses atacadistas até os locais de consumo o transporte seria realizado por vans ou pequenas caminhonetes.

Mesmo assim vamos “jogar o jogo” e realizemos uma análise baseada apenas em dados de consumo de água, algo tão em voga nos noticiários diários, cujo desabastecimento afeta de maneira maléfica grande parte dos paulistanos.

Um copo descartável necessita de água em duas etapas de sua produção:

Etapa 1 – a de menor consumo, está relacionada ao processo de produção propriamente dito e é incorporada ao produto final. Neste caso estamos falando de um consumo de 50 ml por copo produzido;

Etapa 2 – a de maior consumo, relaciona-se com a refrigeração do processo de fabricação, pois tais copos são produzidos por termoformação e tanto o equipamento, quanto os copos necessitam ser resfriados. Neste caso o consumo de água é 3.150 ml por copo produzido.

No entanto, vale uma ressalva com relação à Etapa 2, pois muitas empresas empregam um sistema de recirculação de água, o que minimiza significativamente o consumo. Tais sistemas, se devidamente calibrados, fazem com que a perda de água decorrente do processo de resfriamento seja de 10% a 20% do consumo inicial. Ou seja, a perda de água desta etapa estaria entre 315 e 620 ml, ou em média 450 ml por copo produzido.

Somando-se as duas etapas de consumo de água nós teríamos 50 ml da Etapa 1, com 450 ml da Etapa 2, totalizando 500 ml de água por copo descartável produzido.

Já para o processo de lavagem de um único copo reutilizável emprega-se um total de 350 a 400 ml de água para lavagens manuais, sendo tais medidas obtidas em estudos realizados dentro de nosso laboratório de materiais no IFSP-Itapetininga. Mesmo assim, vale ressaltar que muitos desses estabelecimentos – bares, padarias e restaurantes – possuem lavadoras automáticas, ou o tradicional lava copos, reduzindo o consumo de água para 100 ml por copo lavado aproximadamente.

Sendo assim, podemos constatar que ocorre praticamente um empate entre o consumo de água entre o copo descartável e o reutilizável ao empregarmos o método de lavagem manual. No entanto ao adotarmos um método de lavagem automático, o impacto de consumo de água entre os dois apresenta um benefício para o copo reutilizável da ordem de 5 vezes.

Então minha sugestão é que, em vez de aumentarmos o impacto no meio ambiente imprimindo cartazes que trazem informações infundadas, que tais cartazes fossem empregados para conscientizar o brasileiro da necessidade de se poupar água, evitando o uso da famosa e perversa vassoura hidráulica.

Prof. Bruno F. Gianelli
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo
IFSP – Campus Itapetininga”

Tem alguma dúvida sobre sustentabilidade no seu dia a dia? Então faça sua pergunta. Envie seu e-mail para pergunteaoafonso@gmail.com. Sua dúvida será respondida aqui no blog Sustentável na prática.

Fonte: http://planetasustentavel.abril.com.br/blog/sustentavel-na-pratica/copos-descartaveis-x-duraveis/?utm_source=redesabril_psustentavel&utm_medium=facebook&utm_campaign=redesabril_psustentavel_sustentavelnapratica

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