Para esse trabalho, o espécime que forneceu amostras de DNA foi um papagaio chamado Moisés, nascido no início dos anos 2000. Ele pertencia a um biólogo e hoje vive na casa de uma veterinária, na cidade de Pitangui (MG), a 127 quilômetros de Belo Horizonte.
“Comparando a genomas de outros papagaios e de aves diversas, além do humano, conseguimos identificar genes com diferenças marcantes e que indicam funções importantes na longevidade e nos processos cognitivos, relacionados à aprendizagem vocal da espécie sequenciada”, diz Santos.
De acordo com Patrícia, o sequenciamento identificou cerca de 4.000 genes e mostrou as similaridades do Amazona aestiva com outras aves, mas também o que ele tem de diferente. “Essa busca culminou na identificação de modificações no genoma, ou seja, mutações em certos genes e também a identificação de outros exclusivos de papagaios que dão suporte à ideia de que a capacidade cognitiva e a longevidade são atributos únicos deste grupo de animais, pois eles estão ausentes em outras espécies”, explica.
“Estudos mais detalhados deles, principalmente relacionados a funções cognitivas, podem elucidar questões importantes, pois observamos muitos paralelos entre humanos e esses pássaros.”
Mello dá mais detalhes das descobertas, classificando-as em três principais achados. “Descobrimos alguns genes parálogos (gene duplicado numa determinada espécie ou grupo), que parecem ser específicos dos papagaios”, conta. “Um deles é o chamado PLXNC1, que está envolvido na formação de conexões neurais, ou seja, como uma área do cérebro se liga a outras para formar circuitos neurais.”
De acordo com o pesquisador, já se sabia que esse gene tem uma regulação diferenciada na área vocal das aves e no córtex laríngeo em humano. Ou seja, parece estar envolvido em regular circuitos da fala nas pessoas e do canto nos pássaros. “O fato de ele estar duplicado parcialmente no Amazona aestiva nos indica haver uma regulação aumentada, o que pode explicar a maior capacidade vocal deles”, diz Mello. “Também descobrimos outras duplicações que levaram a genes novos somente em papagaios, mas as funções desses ainda não estão claras.”
Uma segunda descoberta se refere à longevidade. Papagaios e algumas outras aves vivem bem mais do que seria esperado pelo seu peso corporal. A expectativa de vida do Amazona aestiva, por exemplo, é 2,5 a 3 vezes maior do que deveria ser. A grosso modo, isto equivaleria a um ser humano viver 150-200 anos.
“Descobrimos que ele e algumas outras aves longevas, em comparação com as que vivem menos, têm modificações em vários genes que controlam processos como envelhecimento e proliferação celular, reparo de danos ao DNA, tumorigênese (origem de tumores), mecanismos de proteção ao estresse oxidativo e resposta imune, por exemplo”, diz Mello. “Isso sugere que a espécie sequenciada se utiliza de várias vias para ter uma maior longevidade.”
A terceira descoberta trata de modificações em regiões regulatórias de vários genes que controlam o crescimento do cérebro e capacidades cognitivas. Elas são semelhantes às que ocorreram no ser humano e que distinguem o homem de outros primatas, que têm um cérebro menor e menos capacidade cognitivas.
“Isso mostra que alguns mecanismos que levaram a um maior crescimento do cérebro e inteligência em humanos também devem ter atuado para fazer o mesmo nos papagaios”, explica Mello. “Consideramos eles como as aves mais inteligentes, e nesse sentido são como os humanos em relação aos outros primatas.”
Ainda de acordo com o pesquisador da Universidade de Oregon, vários desses genes, quando modificados drasticamente, levam a distúrbios do desenvolvimento cerebral e cognição em humanos, a exemplo de autismo e esquizofrenia.
https://g1.globo.com/natureza/noticia/2018/12/16/como-a-genetica-explica-a-inteligencia-dos-papagaios-os-seres-humanos-do-mundo-dos-passaros.ghtml
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