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As árvores da cidade

As árvores da cidade

Na correria da cidade que não para, as árvores se tornam apenas mais um item da paisagem. Juliana Gatti convida as pessoas a enxergarem além, dando mais valor e se encantando com as árvores vivas de São Paulo.

Um novo olhar sobre as árvores, mais atento e encantado. Esta é a proposta do Passeio Verde, atividade realizada há quatro anos pelo projeto Árvores Vivas. A iniciativa reúne grupos de pessoas de todas as idades em passeios por parques e ruas da cidade de São Paulo, nos quais elas recebem informações sobre as espécies de árvores e o que elas proporcionam para a população. Os participantes são convidados a tocar nas árvores, observar suas peculiaridades e perceber que elas não são apenas mais um item do espaço urbano, e sim vidas com as quais eles convivem e das quais se beneficiam de muitas maneiras.

À frente desta ideia está a designer Juliana Gatti, de 29 anos, especialista autodidata em árvores. Juliana transformou sua paixão em trabalho e hoje dissemina seu encantamento por meio desses passeios.

Em entrevista à Envolverde, Juliana fala sobre as árvores da capital paulista e conta como começou esse trabalho. Confira a íntegra da conversa.

Envolverde – Como surgiu a sua paixão pelas árvores?

Juliana Gatti – Sou designer de formação e trabalhei muito tempo com o desenvolvimento de produtos ecológicos. Quando participei de um trabalho ligado a itens de marcenaria, conheci a xiloteca do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), em São Paulo, que é um acervo de amostras de madeira. Olhar aquela diversidade de madeiras despertou em mim o desejo de saber mais do que apenas o nome científico delas. Eu queria conhecer a árvore viva, que nos dá aquela madeira tão bonita. Deixei de ver as árvores como um simples tronco marrom e uma copa verde. Passei a perceber suas características únicas. Cada uma tem uma textura de casca, um desenho de folha, uma flor. Eu tinha uma vivência intensa com a natureza quando criança, que com o tempo se fragmentou, e esse trabalho fez isso despertar de novo.

E – E então você foi estudar?

JG – Primeiro eu fui buscar informações em livros. Eu fazia caminhadas em ruas, parques e praças, olhando folha por folha, flor por flor, e depois pesquisava. Assim comecei a conhecer um pouquinho mais. Mas eu não queria só identificar. Queria saber a origem, o que cada uma podia fornecer de alimentos ou substâncias para medicamentos, e até alguns materiais que a gente nem imagina que venham das árvores. Comecei também a fazer conexões culturais, colocando a árvore como um eixo central e relacionando com ciências tradicionais, história, mitologia, religião, enfim, uma série de conexões com a existência humana, fora a importância fisiológica para a nossa vida, que é a de purificar o ar que nós respiramos. Comecei um processo autodidata e a ideia foi crescendo. Depois de um tempo, fiz cursos técnicos de paisagismo e jardinagem, nos quais, por sorte, conheci o chefe de Departamento de Botânica da USP (Universidade de São Paulo), que me abriu portas, ajudando com referências bibliográficas e oferecendo a oportunidade de participar de algumas disciplinas como ouvinte.

Projeto Árvores Vivas: quaresmeira-bexiga. / Foto: Juliana Gatti Pereira

E – De que maneira isso se tornou o trabalho que você faz hoje?

JG – Na verdade, a ideia veio de um amigo. Ele sugeriu que eu transformasse isso em um empreendimento. Então passei a encarar como um desafio transformar esse impulso pessoal em algo que pudesse ser compartilhado. Para mim essa relação é muito intensa, eu ando na rua e me deslumbro com a floração de uma árvore. Eu ficava pensando “não é possível, será que todo mundo está vendo isso?”. Nasceu em mim a vontade de despertar este sentimento nas outras pessoas. O próximo passo foi formatar a ideia e o trabalho começou com o fornecimento de mudas para eventos.

E – E como surgiu o passeio verde?

JG – Eu tinha a preocupação de como as pessoas cuidariam daquelas mudas. Se elas iam compreender o seu valor histórico, social e cultural. Então passei a fornecer, junto com as mudas, estas informações, para estimular as pessoas a terem mais cuidado e respeito por essa energia de vida. Em seguida, comecei a receber convites para palestras, dinâmicas, conversas e coisas do tipo. Nesse período, montei um acervo de elementos das árvores, que as pessoas visitam e podem tocar nas sementes, nas folhas, nos frutos e em tudo. A ideia é fazer com que essa experiência desperte nas pessoas o encantamento pelas árvores das ruas e pelas folhas que estão no chão. Daí surgiu a ideia de proporcionar essa sensação na rua mesmo, e surgiram os passeios verdes.

E – E como acontecem estas experiências. Como as pessoas reagem àquilo tudo que você mostra?

JG – Os passeios começaram em 2008, e desde então já recebemos todo tipo de público. Normalmente, quando a pessoa é mais adulta, ela resgata memórias da infância e traz de volta uma afetividade com a natureza. Já para as crianças a experiência é um despertar. Elas reparam em coisas que nunca tinham percebido. Para mim é muito rico ver as pessoas no dia seguinte comentando sobre as árvores que existem em frente as suas casas, com as quais elas conviviam todos os dias e não davam a merecida atenção. Não dá para dimensionar o impacto dessa experiência na vida das pessoas, mas, no geral, a resposta é sempre muito positiva.

E – Hoje em dia, qual a frequência dos passeios verdes?

JG – Logo no começo, surgiram oportunidades vindas da Secretaria do Verde e Meio Ambiente (de São Paulo) e da Secretaria de Educação (do Estado de São Paulo) para trabalhar com um projeto chamado Recreio nas Férias. Aí foi crescendo de forma natural. Não sei quantos passeios, mas hoje a gente atende cerca de 250 pessoas por mês. No total, a atividade já teve aproximadamente 4,4 mil participantes.

E – Os passeios são todos na cidade de São Paulo?

JG – Sim, principalmente na região centro-oeste.

E – Como vivem as árvores da capital paulista? Existem árvores o suficiente?

JG – A cidade tem poucas árvores. A ONU (Organização das Nações Unidas) recomenda que existam 12 árvores por habitante e São Paulo deve ter algo em torno de quatro ou cinco. Algumas campanhas estão melhorando essa situação, mas a quantidade de árvores ainda é baixa para o tamanho da cidade. Além disso, muitas árvores são exóticas, o que significa que elas não pertencem ao bioma da região, que no caso da capital paulista é a Mata Atlântica, o que não era necessário, já que cada hectare do nosso bioma tem mais de 1,5 mil espécies diferentes. Outro ponto é a má condição em que muitas delas vivem. As árvores precisam de espaço para água e para os nutrientes chegarem até a raiz, e isso frequentemente não existe. A gente vê também pela rua muitas árvores enfeitadas e pintadas, o que não é saudável para elas.

E – Existe alguma espécie que seria importante que existisse mais na cidade?

JG – Isso é muito relativo. É difícil dizer qual árvore é melhor para cada lugar. Cada espaço tem uma possibilidade, tanto de largura de calçada quanto, por exemplo, de existência de fios por cima ou não. Isto faz com que a escolha das espécie nas cidades seja um processo bastante criterioso. Tem que ser bastante estudado. Assim, a convivência das árvores com a cidade pode ser mais harmoniosa, evitando cortes desnecessários e permitindo que as árvores se desenvolvam plenamente em um melhor espaço para elas. Para isso, a gente precisa conhecer as espécies. Fora estes pontos, eu aprecio muito as árvores frutíferas nativas, que apresentam uma diversidade muito grande. Na Mata Atlântica, temos as pitangueiras e as jabuticabeiras, que se adaptariam super bem à realidade das árvores urbanas e ampliariam tanto a nossa relação com elas, com o fruto diretamente, além da possibilidade de ampliação da diversidade de árvores.

Fonte: Envolverde

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Comentários

Uma resposta para “As árvores da cidade”

  1. Avatar de Sandra
    Sandra

    Adorei ler sobre trabalho, é muito interessante, amo as árvores de um modo geral, fiquei feliz por saber que tem pessoas que vêem as árvores da mesma maneira que eu vejo, ou seja a importância que as arvores têem , são importantes para filtrar o ar , fazem chover mais o que está cada vez mais raro, quase não vejo mais nuvens. As árvores são lindas. Fico um tanto revoltada por perceber que as pessoas de um modo geral acham que as árvores não servem pra nada. A televisão não consegue divulgar a beleza e a importância das árvores, só ressaltam desmatamento e desrespeito às árvores, como se elas não tivessem valor algum.
    Espero que continue despertando interesse e respeito às árvores.
    Parabéns pelo trabalho,

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